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Por uma escola sem opressão

Colaborador de Navegos, escritor e professor, analisa a partir do simbólico e do real distorções que contaminam a Educação no Brasil.

*Alexandro Alves

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Esta série de artigos sobre o livro Pedagogia do Oprimido, de Paulo Freire, iniciou-se aqui: https://www.navegos.com.br/meu-encontro-com-paulo-freire/ , continuou nesse artigo aqui: https://www.navegos.com.br/paulo-freire-treinador-de-soldados-1/ , o terceiro artigo você encontra aqui: https://www.navegos.com.br/militante-aliena-educacao-em-favor-da-esquerda-2/ e o quarto artigo aqui: https://www.navegos.com.br/criador-da-pedagogia-da-opressao-completa-100-anos/ . Este é, portanto, o quinto, e último, artigo da série. Nos artigos anteriores eu elenquei alguns problemas conceituais, pedagógicos e estruturais da obra em questão. Neste último artigo desejo propor algumas alternativas à pedagogia freiriana. Faço antes algumas considerações pertinentes.

Primeira: eu não sou pedagogo, assim como Paulo Freire não foi. Sou professor e minhas ideais são alicerçadas na sala de aula, tanto na do meu tempo de estudante quanto na do atual momento como docente. Ou seja, eu falo pela experiência vivida. Segunda: as alternativas que proporei não estão dado ao espaço reduzido de um artigo jornalístico, pormenorizadas ou explicadas à exaustão, são, portanto, passagens rápidas, ideias sem, ainda, um desenvolvimento satisfatório. Terceira: algumas ideias não são minhas e mesmo nem novas são.

As ações precisam atuar em dois níveis: o simbólico e o real. Devem estar inter-relacionadas, iniciando no simbólico e alargando o ato à vida cotidiana. Sendo assim, a primeira atitude é retirar de Paulo Freire o título de patrono da educação brasileira. Anular, revogar a lei número 12.612, de 13 de abril de 2012, que concedeu o título a Paulo Freire.

O papel do professor em sala de aula deve ser primordial. A educação parte do professor e vai para o aluno. O aluno não ensina o que sabe ao professor, porque o que aquele sabe não interessa em sala de aula. A ideia é essa mesma: o aluno é agente passivo da ação. Ele recebe a ação. A ação é aprender. A ideia de “agente passivo da ação”, por outro lado, não pode implicar em submissão do discente. Evidente que deve haver diálogos e questionamentos. Porém não com a permissividade contemporânea, em que a figura do professor é escorraçada pelo aluno, pelos pais do aluno, pela mídia, pelos políticos. Essa pandemia serviu também para demonstrar mais um nível de ódio ao professor que varre nossa sociedade.

Várias categorias profissionais trabalharam remotamente: juiz, advogado, professor, até médico. Porém apenas contra os professores ouvimos as bestas-feras da mídia e da política berrando feito bodes: “os professores estão ganhando sem trabalhar desde que começou a pandemia”. É um ódio brutal que nos cerca. A valorização do magistério deve sobretudo abarcar a questão moral e de visibilidade correta da figura do docente. Chacotas promovidas por jornalistas e políticos populistas, incapazes e desonestos deveriam serem respondidas com apedrejamento. O professor é a base de tudo. Inclusive, na sala de aula, precisa voltar, na construção das mesmas, o pódio em que o professor permanecia, que lhe dava posição acima do corpo discente.

Português, matemática e artes precisam estar no centro do processo ensino-aprendizagem. A escola deve formar crianças e adolescentes cultos na língua, com amplo raciocínio lógico e capazes de uma apreciação estética que se inicie ainda cedo, quando o aluno ainda é criança, e essa apreciação estética deve incluir a poesia épica greco-romana e latina, a música clássica, a pintura dos grandes mestres, a literatura moderna, o teatro e o cinema. Deve ser incentivada a leitura de dicionários. Lembro da época em que fazia o ginásio em Recife, a professora de português, a cada semana, nos cobrava um número xis de palavras novas. Então tínhamos que ler o Minidicionário Aurélio, para que quando ela nos perguntasse que palavras novas aprendemos, soubéssemos dizer uma por uma. Assim, aprendi amar os dicionários. Hoje, sou leitor ávido deles. No caso das línguas, nas escolas atuais se ensinam português, inglês e espanhol. A essas línguas seriam incluídas as línguas indígenas brasileiras. Como são inúmeras, cada região escolheria a mais presente em seu território, de forma que línguas tupis, guaranis e tapuias, ou outras, seriam contempladas dependendo do estado da federação.

Hoje, há professores que não gostam de ler. Eu sei do que falo porque já ouvi isso de muitos.

Então, entramos em outra questão. Os professores precisam ser os melhores das turmas. Apenas os mais capazes deveriam ter a honra de ensinar. Hoje, cursos de licenciaturas e de pedagogia em universidades particulares que custam R$ 199,00 mensais proliferam aos borbotões em qualquer fundo de quintal. Qualquer inútil pode pagar por isso. Resultado: estes cursos tornaram-se cursos ralés, quando deveriam ser elitistas. Eu sei que as palavras chocam. Mas o nível em que chegamos precisa ser rasgado com precisão cirúrgica e sem misericórdia. O professor precisa voltar a ser um indivíduo com um nível de sensibilidade acima do corriqueiro. O professor não fala a linguagem do aluno, o aluno é que, a cada dia, se esforça para falar na linguagem do professor. Por coerência. Por respeito. Por admiração.

Outro fator importante é a hora do recreio. Não deve ser apenas de 20 minutos. Deve ser de uma hora, para que dê tempo para o lanche, para as brincadeiras, para os jogos e para as conversas entre os discentes. Um tempo apenas de vinte minutos é rápido demais. Dá apenas para lanchar e voltar para a sala de aula. O aluno precisa voltar para a sala de aula leve, sorrindo, bem alimentado e com o cérebro oxigenado. Essa hora do recreio, sobretudo para as crianças mais novas, Fundamental I, deve ser em um espaço ricamente verde, com muita natureza, árvores, plantas em geral, bancos e animais de estimação. As crianças, através do contato com os animais, aprenderiam respeito, amor e compaixão pela vida e pelo outro. Parece bobo, mas não é. A formação de um bom caráter passa pelo respeito à natureza e aos animais, e nada melhor do que aprender isso na prática, na vivência com a natureza, com a flora e, em especial, com a fauna, desde a infância.

O respeito, sendo introjetado na criança de forma natural, fará parte dela sempre nas outras fases de sua vida. Um professor especial para esse momento do recreio, no Fundamental I, seria necessário. Seria um profissional especializado em psicologia educacional, em direitos dos animais, em direitos humanos e em saberes dos povos tradicionais. Os alunos em idades maiores, inclusive os do Ensino Médio, teriam um recreio mais convencional, porém igualmente lúdico. Por exemplo, uma sala com instrumentos musicais. Se durante as aulas de arte tiveram noções de estilos, de épocas, de compositores e de obras, no recreio poderiam experimentar esse conhecimento na prática. Uma sala de som, em que os discentes pudessem ouvir música enquanto conversavam, também existiria. Assim como a biblioteca, sempre aberta, ampla e ventilada. Uma quadra de esportes também funcionaria na hora do recreio. Cada escola teria sua banda militar ou orquestra, para apresentações e, sobretudo, para o desenvolvimento da cultura musical dos discentes. Seria uma restauração da paideia grega.

Apenas esbarra no problema maior: nossas bestas-feras políticas. Porém sonhar é sempre possível.