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O retratista alemão do baronato de Ceará-Mirim

Em acurada pesquisa histórica, Colaborador de Navegos acaba fazendo descobertasque o levam a ampliar seu olhar e a colocar o leitor em contato com personagens desconhecidas e obscuras que passaram despercebidas por outros pesquisadores.

*José Vanilson Julião

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Quando o jornalista Franklin Jorge indaga algo concreto sobre a morte de Felipe Neri de Carvalho e Silva (Santana do Matos, 2/5/1829 – Caicó, 16/7/1883), o Barão de Serra Branca, além da suspeita de ter sido assassinado por um escravo ao largo do município seridoense, nada encontro, a não ser que um ano antes se encontrava como sócio da tipografia do italiano Angelo Roseli.

Por curiosidade resolvo ver outro potiguar com título de nobreza no regime imperial (II Reinado), Manoel Varela do Nascimento (25/12/1802 – 1/3/1881), o barão do Ceará-Mirim. O faro desperta para o retratista dele e da baronesa Bernarda Varela Dantas. O personagem é registrado em trabalhos acadêmicos. Mas dados pessoais, local e data de nascimento, permanecem desconhecidos.

Um dos artigos mais recentes sobre os retratos tem como autores os sócios do Instituto Histórico e Geográfico, Gustavo Sobral e André Felipe Pignataro (Tribuna do Norte, 5/9/2021). A dupla, como os demais que escreveram sobre o baronato, não se debruça sobre o autor das pinturas, o alemão Johann Brindsiel.

Ouso afirmar: nem mesmo Olavo de Medeiros Fillho em edição especial para o Acervo Virtual Oswaldo Lamartine de Faria. Desconheço até que Luís da Camara Cascudo tenha se debruçado sobre o misterioso personagem. Somente o Instituto Ludovicus, que guarda acervo cascudiano, para esclarecer o curioso jornalista.

De concreto no plano local: os retratos do barão e da baronesa se encontravam com o tetraneto do casal, o ex-prefeito e ex-deputado estadual – em três legislaturas no Executivo e Legislativo – Roberto Pereira Varela (4/11/1928 – 4/10/2006). E que posaram para os olhos do pintor germânico, munido de pincéis e tintas, em 1866.

A pesquisa indica que ele se encontra no meio da Revolução Praieira (1844/50), que recebe aquele nome pelo fato do porta-voz dos liberais contra os conservadores, o “Diário Novo” (1842/1852), ter sede na Rua da Praia, do Bode, dos Judeus – no tempo dos holandeses (1630/54) -, da Cruz (ainda no século XV na retomada pelos portugueses), atual Bom Jesus até 1870 (século XIX), a mais antiga do Recife.

O jornal tinha entre os colaboradores José Inácio Abreu e Lima (Recife, 6/4/1794 – 8/3/1869), que sai do Brasil dois anos após o assassinato do pai, o padre Roma (1768 – 1817), na Revolução Pernambucana, e participa do exército revolucionário do general colombiano Simon José Antonio de La Santissima Trindad Bolivar e Palacios Ponte-Andrade y Blanco (1783 – 1830).

No periódico o personagem nômade pela profissão anuncia serviço, no sétimo ano de circulação, nas edições 127 (sexta-feira, 9/6/1848), 128 (terça, 14/6), 129 (quarta, 15/6) e 130 (quinta, 16/6), a seção “Avisos diversos” (página três), estampa:

– O professor e retratista João Bindseil – aprovado pelas academias de Munique e Dusseldorf – pretende demorar-se alguns meses na viagem para a corte. As pessoas que queiram utilizar-se de seu prestígio – sejam para retratos como para qualquer outra obra de desenho – dirigir-se a casa de Hermann Dethard Kalkmann & Daniel Rosenmund (Rua da Cruz 10).

No ano seguinte o “Diário de Pernambuco” (138 – segunda-feira, 25/6 e 140 – sábado, 25/6) anuncia mudança de endereço. Para o terceiro andar do número 40 no mesmo logradouro. “Continua a tirar retratos com a mesma perfeição” (9 ás 10 horas).

Está na missão científica chefiada pelo médico e naturalista francês Louis-Jacques Brunet (Moullins, 1811 – 1877), incumbida pelo presidente da província (1851/53, o bacharel em Direito Antonio Coelho Sá e Albuquerque (1821 – 1868), de “observar a posição geográfica dos principais pontos”. O político governou Alagoas, Pará e Bahia. Foi ministro (Negócios Estrangeiros e Agricultura, Comércio e Obras Públicas). E senador por Pernambuco.

Viúvo chega com o filho Charles Theobald Brunet, oficial reformado do Exército. A chegada à Paraíba em junho de 1853 foi comunicada ao Ministro do Império pelo Presidente da Província, que o apresentou como “naturalista de bastantes conhecimentos e habilidades”. Logo o Governo Imperial apressou-se em contratá-lo para as expedições científicas.

Aquele e o desenhista da expedição Bindseil deram com um menino prodígio, de nove ou 10 anos. Em carta ao presidente reconhece: “Descobri um rapaz sem fortuna que possui um talento extraordinário para a pintura. Desde que sei de minha arte, tanto quanto basta para apreciar um talento nascente, não me lembro de ter encontrado outro igual”.

O pintor paraibano Pedro Américo de Figueiredo e Melo (Areias, 29/4/1843 – Florença/Itália, 7/10/1905), filho do comerciante e violinista Daniel Eduardo e Feliciana Cirne, é agregado a expedição. E por 20 meses segue pelas províncias de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e Piaui como substituto ou auxiliar do adoentado alemão João Bindseil, encarregado de ilustrar fauna e flora.

Brunet se fixa no Recife. Em ofício (7/4/1856) sugere mudança na grade de estudo (1º ano Zoologia, 2º Botânica e 3º Mineralogia e Geologia). É o fundador do primeiro Museu de Ciências Naturais do Norte/Nordeste. Regedor do Ginásio Provincial por Dom Pedro II e o governador da Província José Alexandre Barbosa Lima.

O Museu Louis Jacques Brunet mantém acervos de história natural com mais de seis mil peças, sendo pelo menos três mil de animais, esqueletos e insetos empalhados, outras de arqueologia, paleologia, coleção de plantas, moedas raras.

Em outubro de 1855 foi nomeado professor da 2ª cadeira de Ciências Naturais, ficando ao cargo dele a estruturação da disciplina e organização do gabinete de Ciências, fundado em 22 de outubro de 1855 (recebendo as coleções coletadas nas expedições).

Quanto a Brindseil o roteiro tem indicação da “folha díaria de propriedade de I. J. Ferreira”. O “Publicador Maranhense” (número 93 – Sábado, 25/4/1863), com sede no Largo do Rosário, 3, em São Luiz, veicula reclame “Retratos á oléo” (quarta e última página). Na capital maranhense (1863/66) acaba envolvido numa questão judicial para devolução de 750 mil réis.

Indica que o germânico chegado a pouco tempo na cidade oferece ao “ilustrado público os serviços; promete no desempenho da arte empregar todo o zelo, a quem o honrar com encomendas.” A oficina está instalada na casa de Manoel Pereira Brito Meireles (Rua da Estrela, 66).

No primeiro ano de circulação diária o “Jornal do Ceará” (número 167 – domingo, 21/6/1868), com redação na Rua Formosa, na capital, logo na capa (são quatro páginas) informa que no expediante do dia 15 do mesmo mês o vice-presidente da província atende petição a pedido do alemão há anos residente no país e o nomeia para ensinar desenho no Liceu Cearense, cuja cadeira se encontrava vaga, além de que nenhuma outra pessoa concorreu com as “precisas habilitações.”

Ensina particular no Colégio Atheneu Cearense. Desenhos e gravuras. Retirada para o Aracati (22 de setembro de 1867). Associado com o portugues Leal (1868), que andou trazendo novidades dos Estados Unidos. Em 1869 está associado a Pinto de Sampaio e com o dinarmaques Niels Olsen.

Faz trabalhos para a exposição nacional (2/12/1961 a 16/1/1862). Em espanhol (tradução) há obra com 263 páginas (Tipografia Nacional): “Catálogos dos produtos naturais e industriais remetidos das províncias do Império do Brasil que figurarão inaugurada na corte do Rio de Janeiro no dia 2 de dezembro de 1861”.

– Dita de jatobá: é a nossa gomma copal, mencionada pelo padre Manoel Ayres do Casal na Corografia Brasileira; solúvel no álcool; o pintor allemão Bindseil, que por aqui viajou, a empregava para envernizar seus quadros da mesma maneira que a copal da Ásia, achando nela os mesmos efeitos daquela.

Em linha geral: a resina copal é originário do sul do México. Retirada da árvore Protium copal e medicinal para maias. Fossilizada (“pom” na língua maia) derivada do espanhol “copalli” (incenso), comparada ao ambar, extraída da floresta tropical. Exemplo: jatobá. Genero Hymenaea, esp. de H. courbaril.

Nativa da floresta Amazônica e América Central. É encontrada em Minas Gerais, Bahia e Pernambuco. Produz a partir do caule e dos ramos resina densa, aromática, com odor semelhante ao incenso. Outro tipo é denominado popularmente de “trapucá”, “resina animada”, “goma copal”, “copal América” ou “copal do Brasil”, com aplicações na indústria de vernizes. Há duas espécies do gênero Hymenaea: H. courbaril Linn e H. martiana Hayne.

FONTES

A União

Diário de Pernambuco

Diário Novo

Jornal do Ceará

Jornal do Comércio

O Cearense

Publicador Maranhense

Revista da Semana

Ateliê Os Curumins

Brasil Escola

Bzzz

Câmara dos Deputados

Ceará-Mirim Cultura & Arte

Coleção Mossoroense

Enciclopédia Itaú Cultural

Francisco José Ferreira da Silva

Fundação Alexandre de Gusmão

Fundação Getúlio Vargas (Cpdoc)

Guamaré na Tela

Portal Clemildo Brunet

Professor Fred

Projeto Brasil – França

Recife Antigo

Ricardo Varella

História da Fotografia no Ceará do Século XIX – Ary Bezerra Leite