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Cleudo Benarez em concerto

Compositor e pedagogo conversa com o Fundador de Navegos sobre criar e viver em Natal, cidade festeira estigmatizada pelo suburbanismo cultural.

*Franklin Jorge

Influenciado pelo rock e a música de raiz do Rio Grande do Norte, Cleudo Benarez  tem músicas gravadas por intérpretes como Valéria Oliveira, Marina Elali e as bandas Alphorria e Araketu,  analisa o cenário musical local e percebe que os nossos músicos evoluíram muito, tecnicamente, nos últimos anos, mas a escassez de mercado e a dependência do Estado ainda são pontos mal resolvidos.

Acredito muito hoje no funcionamento de sistemas em rede. Seria muito bom pra arte e pra cultura locais poder criar um sistema de rede para divulgação do nosso trabalho nas redes sociais, da produção aos produtos, o que daria maior visibilidade aos artistas.

Você tocou num ponto nevrálgico que devia estar nas preocupações dos nossos gestores culturais, acrescento eu. Quando dirigi a Sala Natal, um dos departamentos da Secretaria Municipal de Cultura, sugeri ao secretário de Carlos Eduardo que lançasse mão desse recurso, mas ele calado estava, calado ficou. Expliquei-lhe que Natal, considerada a “cidade espacial” do Brasil, precisava redirecionar a cultura para um outro patamar. Ou seja, devia ser um exemplo de modernidade. Curioso é que, um ano e meio depois, quando Dória se elegeu prefeito de São Paulo, o secretário nos reuniu, a nós diretores, para relatar a visita que fizera ao lado do prefeito em busca de sugestões e a primeira pergunta de Doria a Carlos Eduardo teria sido, justamente, sobre as redes sociais. Dácio Galvão é a própria negação da vocação de Natal para o cosmopolitismo. Parece que vamos continuar a ser provincianos e atrasados, especialmente nessa área que Sandemberg Oliveira descreveu, em entrevista recente, como “ostrificada”. Ele me fez sentar diante dele e o tempo todo, enquanto falava, olhava em minha direção.

Traduzi isto como a confirmação de que eu estava à frente de Dória, ao fazer-lhe tal sugestão. Como resultado dessa dispendiosa visita ao prefeito de São Paulo, ele criou um zap para a secretaria de cultura que nada agregou à vida cultural da cidade, sempre fadada ao anonimato e a um provincianismo suburbano que caracteriza bem nossos gestores. Por isso, sempre tenho a impressão que temos involuído culturalmente a cada nova gestão.

Que me diria a respeito?

Possivelmente os motivos são muitos e vão desde a dedicação dos artistas à militância político-partidárIa e à falta de referências, lacra Cleudo Benarez.

Como a Educação entraria nesse processo?

Tenho um apreço especial pela educação e ainda sinto muita falta da presença da arte na escola formal do Rio Grande do Norte. Acredito que um projeto de prática e fomento das artes nas escolas daria início a um ciclo virtuoso da cultura no Estado.

A seu ver, para que serve essa tal de “economia criativa” de que tanto fala o secretário?

A ideia me parece positiva no sentido de estimular o surgimento de um mercado, mas a importação do pensamento de Bourdieu, com o seu conceito de capitais, me parece muito mais uma tentativa de formar empresários de cultura do que criadores. Em relação aos demais criadores, me parece que os músicos evoluíram mais.

Como vê a disparidade entre a remuneração de pseudo-celebridades e os artistas da terra?

Eu vejo isso com muita naturalidade, já que são as regras do mercado em combinação com dependência política que beiras a subserviência. Porém, se a gente despertar para o poder do trabalho em rede, ganharemos em autonomia e valorização.