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Bando de dois

Colaborador de Navegos continua a garimpar o melhor dos Quadrinhos brasileiros e estrangeiros, aproximando os aficionados de um gênero de massa por muito tempo discriminado por leitores elitistas.

*Jamal Singh

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“Quem nasce pro sertão, não fica preso em gaiola.”

Os cangaceiros Tinhoso e Caveira de Boi são os únicos sobreviventes do confronto do seu bando com os Volantes (soldados que percorriam a caatinga em busca dos cangaceiros) do Tenente Honório.  Seus colegas foram degolados e suas cabeças colocadas em caixas e guardadas em uma carroça que segue rumo a capital, como provas da eficácia do Tenente. Tinhoso tem uma missão dada em uma visão sobrenatural: Os fantasmas de seus colegas aparecem a ele quando ele está às portas da morte e lhe intimam a recuperar os restos mortais dos companheiros. Caveira de Boi tem objetivos menos nobres: está interessado em um mapa que mostra onde foi escondido os espólios de um roubo aplicado por um dos companheiros mortos. Os dois juntos formam o “Bando de dois” do título.

Um clássico moderno. E ainda é pouco para descrever essa obra do aclamado publicitário e quadrinista Danilo Beyruth, que na época da publicação vinha do sucesso ‘Necronauta”. “Bando de Dois” é um quadrinho de cangaço que na época de seu lançamento foi muito criticado por ter sido escrito por um paulista e por não ser regional o suficiente. Pois bem, a força de “Bando de dois” reside justamente nele ser praticamente um faroeste (no caso um Nordestern), e sua história ter elementos universais.

Mas ao mesmo tempo, lá está o nosso sertão nordestino. O sertanejo, esse forte que sobreviveu aos cangaceiros e aos volantes. Os beatos. E as dunas que avançam e destroem os vilarejos. todos eles estão lá. Em “Bando de Dois” os cangaceiros não são representados como heróis, ou como apenas feras sanguinárias. Muito menos a volante é uma força do bem. O quadrinho foge desse maniqueísmo e produz uma história de vingança, com tiroteios, lutas de peixeira e explosões numa batalha final num vilarejo perdido nas dunas. È um quadrinho que se lê num fôlego só, empolgante como a maioria dos quadrinhos “certos regionalmente” acabam não o sendo.

A arte de Danilo Beyruth é sensacional, uma mistura brasileira de autores clássicos como Alex Toth, Jack Davis, Milton Caniff e Will Eisner. A história tem uma linguagem cinematográfica na sua narrativa que espelha os enquadramentos, o estilo visual, a dinâmica das ações costumeiras do faroeste. As ilustrações panorâmicas prestam um grande serviço em ambientar o leitor nessa atmosfera e o texto enxuto permite que as imagens falem por si.

Bando de Dois foi publicada pela Zarabatana Books em 2010 após receber financiamento do Programa de Ação Cultural do Estado de São Paulo (ProAc), edital de 2009. Recebeu várias premiações, como as de Melhor HQ Nacional 2010 (Universo HQ, Blog dos Quadrinhos), Melhor Lançamento 2010 (Prêmio Angelo Agostini) e Melhor Desenhista, Roteirista e Edição Especial Nacional (Troféu HQ Mix). Esse ano ele foi relançado numa edição colorizada e em capa dura para comemorar seus dez anos de publicação. Em preto e branco ou colorida, é um dos quadrinhos brasileiros essenciais do século XXI.