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Às máquinas, o mundo!

Os milhões de postagens, comentários e compartilhamentos no Facebook e Twitter por hora, as milhares de buscas no Google por minuto e as centenas de fotos que sobem no Instagram por segundo são a matéria-prima da mais importante inovação tecnológica do século 21: a inteligência artificial, que vigia as sociedades contemporâneas

Honório de Medeiros

Conto, em meu livro “Poder Político e Direito – A Instrumentalização Política da Interpretação Jurídica Constitucional”, um fato narrado por Sir Winston Churchill em “My Early Life – A Roving Comission” para ressaltar seu “lado” pouco conhecido de epistemólogo que fez uma opção decidida pelo Realismo, em oposição ao Idealismo.

Esse seu “lado” de filósofo – é bom lembrar que ele foi também escritor, pintor e memorialista, e a sua obra “Memórias de Guerra (1948-1954)” valeu-lhe o Prêmio Nobel de Literatura em 1953 – me veio à mente ao ler, quase que por acaso, uma frase que ele proferiu: “Moldamos os nossos prédios e depois eles nos moldam”.

A leitura foi da excelente resenha que Ricardo Abromovay publicou na revista “Quatro Cinco Um”, acerca de três obras ainda não traduzidas para o português e que tratam daquilo que o autor denomina de “Sociedade da vigilância em rede”.

Pois bem: Abromovay nos induz ao seguinte raciocínio analógico: se nos moldam os prédios que nós construímos, segundo o brilhante insight de Churchill, podemos esperar algo diferente em relação à rede mundial de computadores?

Até aí, tudo bem. É difícil quem pense o contrário entre “cabeças pensantes”. O problema é que o diabo mora nos detalhes, como diz o famoso provérbio alemão.

Cito Abromovay: “Na verdade, as informações permanentemente coletadas e analisadas por algoritmos, cujo funcionamento nos é completamente opaco, permitem que nossa conduta seja previsível e, justamente por isso, abrem caminho a uma interferência em nosso cotidiano que é inédita e atinge todas as esferas da vida social”.

Em 2014, por exemplo, a Amazon patenteou um sistema que permite antecipar o que os clientes querem comprar, antes mesmo que eles próprios o saibam. A mágica está nas informações reunidas sobre cada um de nós e na análise que delas é feita.

Apavorante.

Lembrei-me que certa vez perguntaram a Stephen Hawking se a inteligência artificial iria nos superar – a chamada “singularidade tecnológica”. “É bem provável que sim”, respondeu ele. E propôs embutir sensores éticos nas nossas máquinas inteligentes. “Como assim”, perguntei-me. “Sensores éticos?”

E me lembrei da sociedade distópica imaginada por George Orwell em “1984”: no futuro totalmente controlado por intermédio da inteligência artificial não é o “Grande Irmão” quem dará as cartas.

Serão as máquinas.

Honório de Medeiros, advogado, é mestre em direito de Estado pela UFCE.

DESENCANTO COM A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL O professor titular do Departamento de Economia da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da USP Ricardo Abramovay, que resenhou para a revista “Quatro Cinco Um” os livros “Re-Engineering Humanity” (Cambridge University Press;2018), de Brett Frischmann e Evan Selinger, “Future Politics” (Oxford University Press; 2018), de Jamie Susskind, e “The Age of Surveillance Capitalism” (PublicAffairs; 2018), de Shoshana Zuboff, inéditos no Brasil; Abramovay é autor de “Muito Além da Economia Verde” (Planeta Sustentável; 2012) e coautor do e-book “Lixo Zero: Gestão de Resíduos Sólidos para uma Sociedade Mais Próspera”